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“Reduz a tensão arterial” e “aumenta a resistência física”: Será o sumo de beterraba “milagroso”?

13 Mar 2024 - 10:14

“Reduz a tensão arterial” e “aumenta a resistência física”: Será o sumo de beterraba “milagroso”?

O sumo de beterraba está a ser promovido nas redes sociais como uma receita para reduzir a pressão arterial, diminuindo assim o risco de doenças cardíacas e acidentes vasculares cerebrais (AVC). Numa das publicações partilhadas alega-se que beber este sumo diariamente “reduz a pressão arterial dentro de 24 horas”.

A razão apresentada para este alegado efeito é o facto de a beterraba conter nitrato inorgânico, um composto que, supostamente, “aumenta a resistência física e permite que atletas se exercitem por até 16% de tempo a mais”.

É ainda referido que a beterraba contém “boas quantidades de antioxidante e carotenoides”, ajudando “a evitar que o colesterol mau se acumule nas paredes das artérias”.

Serão estes benefícios reais? Terá a beterraba efeitos comprovados na redução da tensão arterial? E na diminuição do risco de enfartes e AVC?

É verdade que o sumo de beterraba reduz a pressão arterial? 

As alegações partilhadas nas redes sociais sobre o sumo de beterraba têm algum fundamento, mas são exageradas. 

De facto, foram realizados alguns ensaios clínicos sobre os benefícios da beterraba (em sumo ou em suplemento) na redução da tensão arterial, mas, até à data, as conclusões são imprecisas, como explica ao Viral José Pedro Sousa, cardiologista no IPO do Porto e membro da Sociedade Portuguesa de Cardiologia.

“Em metade dos estudos mostrouse que a suplementação com beterraba e nitrato inorgânico se associa, de facto, a uma redução estatisticamente significativa da tensão arterial”, explica o especialista. 

Segundo a literatura existente, o consumo de beterraba pode diminuir a tensão arterial, mas “tal redução será irremediavelmente modesta e referente, sobretudo, à tensão arterial sistólica” – conhecida popularmente como “máxima”

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Isto significa que a beterraba tem um efeito potencial na redução da tensão arterial – que pode ocorrer num prazo de 24 horas -, mas não será significativo para reduzir o risco de doença cardíaca.

Por essa razão, o sumo de beterraba, mesmo que ingerido diariamente, não deve ser usado como substituto dos medicamentos prescritos para este efeito.

Há um fundamento correto nestas alegações, mas a beterraba é apresentada como se fosse um ‘super’ alimento”, afirma José Pedro Sousa, sublinhando que em pacientes com diagnóstico de hipertensão este sumo “não vai resultar”.

O especialista lembra que o consumo regular de vegetais é “inequivocamente encorajado em doentes” com hipertensão.

Por que razão o sumo de beterraba pode ajudar a reduzir a tensão arterial?

O que provoca este efeito é a existência de nitrato inorgânico na composição da beterraba. Este elemento tem “poucos efeitos biológicos diretos”, mas, quando é “convertido ou metabolizado” em óxido nítrico, ganha um “grande potencial biológico”, esclarece José Pedro Sousa. 

Este composto tem efeitos desde “a regulação da neurotransmissão à da imunidade, do manuseamento de oxigénio e do fluxo sanguíneo” – nomeadamente ao nível do “relaxamento da parede dos vasos sanguíneos”, diminuindo a tensão exercida pelo sangue nas paredes das artérias.

Numa revisão sistemática, publicada em 2021, os autores identificam vários benefícios associados ao consumo de sumo de beterraba, entre eles os “efeitos de vasodilatação, que reduz pressão arterial e aumenta o oxigénio e a distribuição de nutrientes aos vários órgãos”. 

Os investigadores concluem também que este composto “pode ter aplicações relevantes na prevenção e tratamento de doenças cardiovasculares”. 

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Apesar destas conclusões, José Pedro Sousa alerta que esta “intervenção dietética não deverá equiparar-se ou sequer substituir-se a um medicamento anti-hipertensor convencional”. Perante um diagnóstico de hipertensão, deverá seguir a medicação prescrita pelo profissional de saúde.

O sumo de beterraba é “bem tolerado pela maioria dos indivíduos”, não tendo risco conhecidos para a saúde. No entanto, poderá estar associado a “efeitos adversos ocasionais”, nomeadamente dor de cabeça e desconforto gastrointestinal.

Sumo de beterraba também reduz o colesterol “mau”?

A publicação partilhada nas redes sociais sugere ainda que a utilização de beterraba em sumos naturais evita que o colesterol “mau” se acumule nas artérias, devido às “boas quantidades de antioxidantes e cartenóides”.

José Pedro Sousa reconhece que o sumo de beterraba “apresenta uma composição química bastante interessante”. Este legume contém nitrato inorgânico, assim como “quantidades expressivas” de fibra, fitonutrientes (incluindo os carotenóides) e vitaminas (B9 e ácido fólico).

“Estes dois últimos componentes exercem tipicamente uma ação antioxidante e até anti-inflamatória”, explica ainda José Pedro Sousa. 

Esta ação poderá ter diferentes efeitos potenciais “quimiopreventivo”, “anti-aterosclerótico” (de evicção da acumulação de colesterol “mau” na parede arterial) e de “melhoria da função da camada mais interna da parede vascular” (designada de endotélio).

O cardiologista afirma ainda que, apesar de se esperar “uma melhoria metabólica” associada à ingestão de beterraba, essa hipótese “foi já testada empiricamente”, mas foi, “infelizmente, desmentida, particularmente no que refere à sensibilidade à insulina”.

O sumo de beterraba aumenta a resistência física?

Sobre as alegações de que o sumo de beterraba aumenta a resistência física, a evidência científica disponível atualmente também não é robusta: alguns estudos referem que existe melhoria da performance desportiva, outros concluem que não há quaisquer efeitos.

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José Pedro Sousa afirma que, de facto, “alguns índices de performance fisiológica poderão ser melhorados pelo consumo – tanto agudo como crónico – de beterraba e de nitrato inorgânico, nomeadamente os períodos temporais de caminhada total e até à exaustão”.

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Uma revisão sistemática, publicada em 2021, sublinha que o consumo de sumo de beterraba “tem impacto na distribuição de oxigénio para a musculatura esquelética, eficiência dos músculos, tolerância e resistência e pode ter um impacto positivo na performance desportiva”. 

Anos antes, um artigo de revisão (2017) avançava que existe “evidência convincente” de que uma dieta com suplementação de óxido nítrico em adultos mais velhos “melhora a performance fisiológica (aumenta o tempo até à fadiga)”. Os autores do artigo sublinhavam, contudo, a necessidade de realizar mais estudos para se atingirem “conclusões robustas”.

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Alimentação

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